quarta-feira, agosto 11, 2010

CONVITE



Caros amigos,

Quero convidá-los para o concerto que acontecerá nesta sexta-feira - dia 13 - às 21:00h no Teatro Pedro Ivo Campos. No programa, o concerto Tríplice de Beethoven (assim chamado por ter três solistas junto à orquestra - no caso: piano, violino e violoncelo) e minha mais nova composição: um concerto para piano, violino, viola e orquestra sinfônica. O título dessa obra é Aurora consurgens, alusão a um antigo tratado alquímico (cada um dos quatro movimentos representa uma das fases da alquimia: Nigredo, Albedo, Citrinitas e Rubedo). O violinista, o violista e o violoncelista vieram da Itália especialmente para participar desse evento, são excelentes musicistas (tocam na Sinfônica de Roma).
Nas duas obras farei a parte do piano, e a regência será do maestro Jeferson Della Rocca.

Espero que possam vir.

Alberto Heller

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Aurora Consurgens


Concerto para piano, violino, viola e orquestra


Alberto Andrés Heller


O título ‘Aurora Consurgens’ (que pode ser traduzido por aurora nascente, ou aurora surgente) faz referência a um antigo tratado alquímico (por muito tempo atribuído a Tomás de Aquino) cujo manuscrito original remonta ao século XV. Em linguagem hermética, o texto (constituído em grande parte por passagens bíblicas) revela uma profunda mística espiritual, característica da maioria dos escritos alquímicos.

A antiga alquimia caracteriza-se por uma combinação entre ciência e religiosidade ou, mais especificamente, entre química, física, medicina, astrologia, filosofia, arte e religião. Entre seus objetivos principais destacavam-se a transmutação dos metais inferiores ao ouro (a busca pela pedra filosofal), a obtenção de um remédio que curasse todas as enfermidades e garantisse a vida eterna (o elixir da longa vida) e a criação de vida humana em laboratório (os “homunculus”). Hoje se sabe que essas expressões devem ser compreendidos metafórica e simbolicamente, e que esse tipo de linguagem foi utilizada principalmente por medidas de segurança (em vários momentos da história os alquimista foram perseguidos, por exemplo pela Igreja Católica) e para confundir os leitores “indignos” e leigos ou não iniciados, já que nem todos estariam aptos ou preparados para determinados tipos de informação. Por detrás de experimentos aparentemente bizarros ocultava-se, portanto, a busca pelo desenvolvimento humano e pela transformação do espírito: por meio das operações alquímicas – que visavam a ‘grande obra’ (o “opus alchemicum”) – o alquimista não purificava o metal, mas a si mesmo.

Apesar de haverem obviamente discordâncias e divergências, a maioria dos tratados alquímicos previa para a transformação do metal inferior (geralmente chumbo) em ouro quatro operações, denominadas respectivamente Nigredo, Albedo, Citrinitas e Rubedo. Baseei os quatro movimentos deste concerto nessas operações, razão pela qual falarei um pouco sobre cada uma delas.

1. Nigredo

Toda transformação se inicia (simbolicamente) com a morte ou deterioração daquilo que se tornou antigo e ultrapassado, que não mais nos serve e que nos impede de mudar e crescer, e que precisa portanto “morrer” para dar lugar ao novo (pense-se na aparente morte da lagarta antes de sua transformação em borboleta). Os alquimistas falam aqui em dissolução da matéria ou em putrefação, razão da associação com a cor negra – daí o nome nigredo e da operação ser também conhecida por “operação negra” (ou melanosis). A associação com o chumbo é porque esse seria um metal “inferior” ou “adormecido” – e que precisa ser “despertado”. O estágio inicial é, assim, de crise; e sair dessa crise significa entrar em contato direto com elementos tais como angústia, medo, raiva e desilusão.

2. Albedo

A substância precisa agora ser “purificada”, de onde vem a associação com a cor branca – albedo ou “operação branca” (ou leukosis), representando o poder iluminador da luz sobre a prima matéria. Fala-se muito neste estágio na “lavagem” da substância, onde surgem com freqüência a água, o banho, a imersão e outras figuras análogas (e também a prata e o prateado, bem como a luz lunar). Assim como o cirurgião precisa higienizar suas mãos antes de uma operação, assim também deve proceder a pessoa que deseja entrar em contato com o sagrado.
Não se trata, porém, de um banho “relaxante”, mas de uma experiência intensa e difícil, quase como numa espécie de exorcismo (e me vêm agora à mente as figuras de monstros e demônios presentes à entrada de algumas catedrais européias).
Em relação ao albedo, uma associação que me veio de imediato foi um ritual de purificação comum em muitas tribos indígenas, no qual a pessoa fica por muitas horas (às vezes dias) dentro de uma pequena tenda sob alta temperatura e vapor (quase uma espécie de sauna); submetido assim à elevada pressão e temperatura, o corpo sua, e nesse suor se eliminariam toxinas e outras substâncias, purificando a carne e o espírito. No México esse ritual é conhecido como ‘Temazcal’ – e pensei o segundo movimento do concerto como uma espécie de Temazcal, onde tento, através da música, provocar a taquicardia e a sudorese (especialmente através do uso forte e ininterrupto da percussão - dois atabaques e tímpanos).

3. Citrinitas
Uma vez “putrificada” e depois “lavada”, finalmente a substância está apta a ascender a um grau mais elevado de energia, chegando às vibrações mais sutis – o ouro. O metal foi transmutado do chumbo à prata, e agora da prata ao ouro (da luz da lua à luz solar), o grande despertar. Encontramos aqui todo tipo de associação à luz solar e ao dourado, daí o nome citrinitas – ou “operação amarela” (ou xanthosis).
Elevar uma freqüência exige, porém, intensidade e esforço; a intensidade das operações anteriores ainda se faz sentir aqui.

4. Rubedo
Aparentemente, uma vez alcançado o ouro, não mais se faria necessária outra operação. Mas se faz, sim, pois o ouro, apesar de nobre, é frio. E esse frio precisa ser aquecido, precisa de calor, precisa do vermelho – de onde passamos ao rubedo ou “operação vermelha” (ou iosis).
Penso aqui especialmente na história de Buddha, que após uma semana de meditação sob a árvore Boddhi alcançou finalmente a iluminação; mas ele não permaneceu no Nirvana: após a experiência da beatitude, ele retorna ao mundo dos homens, ao calor humano. É desse calor que trata o rubedo: do calor do coração, do amor (cristão), da graça, da vida.
O quarto movimento representa esse amor.

O título ‘Aurora Consurgens’ aponta, em última instância, para um desejo de renovação. Às vésperas de 2012, quando se comenta de um possível fim dos tempos, presenciamos em nível mundial um período de grandes crises (humanas, naturais e outras); que seja apenas um período de “nigredo”, e que a humanidade possa sair purificada e renovada desse processo, iniciando então uma era mais dourada e calorosa.





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