Fragmento do livro de
Octavio Paz, A dupla chama –amor e
erotismo
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Tanto nos sonhos como
no ato sexual abraçamos fantasmas. Nosso parceiro tem corpo, rosto e nome, mas
sua realidade, precisamente no momento mais intenso do abraço, dispersa-se em
uma cascata de sensações que, por sua vez, dissipam-se. Há uma pergunta que se
fazem todos os apaixonados e que condensa em si o mistério erótico. “Quem é
você?” Pergunta sem resposta... Os sentidos são e não são deste mundo. Por meio
deles, a poesia ergue uma ponte entre o ver
e o crer. Por essa ponte a
imaginação ganha corpo e os corpos se convertem em imagens.
A relação entre
erotismo e poesia é tal que se pode dizer, sem afetação, que o primeiro é uma
poética corporal e a segunda uma erótica verbal. Ambos são feitos de uma
oposição complementar. A linguagem – som que emite sentido, traço material que
denota ideias corpóreas – é capaz de dar nome ao mais fugaz e evanescente: a
sensação; por sua vez, o erotismo não é mera sexualidade animal – é cerimônia,
representação. O erotismo é sexualidade transfigurada: metáfora. A imaginação é
o agente que move o ato erótico e o poético. É a potência que transfigura o
sexo em cerimônia e rito e a linguagem em ritmo e metáfora. A imagem poética é
abraço de realidades opostas e a rima é cópula de sons; a poesia erotiza a
linguagem e o mundo porque ela própria, em seu modo de operação, já é erotismo.
E da mesma forma o erotismo é uma metáfora da sexualidade animal. O que diz
essa metáfora? Como todas as metáforas, designa algo que está além da realidade
que lhe dá origem, algo novo e distinto dos termos que a compõem. Se Górgora
diz púrpura nevada, inventa ou
descobre uma realidade que, embora feita de ambos, não é sangue nem neve. O
mesmo acontece com o erotismo. Diz, ou melhor, é alguma coisa diferente da mera
sexualidade.
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