quarta-feira, janeiro 07, 2015

AMIZADE E EROTISMO




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Na philia grega, na amicitia romana ou na caritas/ágape das comunidades cristãs primitivas, a prática da amizade era propriedade de uma elite ou visava a um Bem Comum Universal. Seu objetivo final era conhecer a verdadeira essência do ato que torna um homem santo ou sábio. Além do mais, todos esses arcanos da amizade moderna tinham como condição da verdadeira realização a abolição dos prazeres sensíveis, inclusive os prazeres sexuais. A amizade contemporânea, por seu turno, herdou das antepassadas a mesma repulsa ao prazer, desprezando, além disso, a dignidade moral com que foi outrora investida, vindo a tornar-se um puro artefato compensatório para os males da sociabilidade pública e privada. Na ética da amizade foucaultiana, o sexo pode ou não estar presente, mas nem deve ser aprioristicamente expurgado nem encampar as possiblidades de prazer que ela pode produzir.
Foucault pretendia conciliar, em suma, o melhor da Grécia e de Roma com o sentido de liberdade presente no sujeito ocidental contemporâneo. Sua noção de amizade aludia a uma espécie de teia de relações fluidas, flexíveis, em que os sujeitos pudessem sempre escapar das normas que fixam “identidades sociais”, elaborando novos experimentos de subjetivação. É este, em meu entender, o sentido da frase acima mencionado. “A verdadeira liberação significa conhecer a si mesmo e, frequentemente, só pode ser realizada por intermédio de um grupo, seja qual for.”
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A amizade seria, desse modo, uma espécie de dispositivo renovador de subjetividades, no qual a “ascese” dominaria a “disciplina” na criação de estilos de existência, conforme os preceitos da liberdade imaginada por Foucault. Essa liberdade, grosso modo, pode ser aproximada do que outros pensadores teorizam como sendo a liberdade de recriação subjetiva do sujeito num mundo onde a tradição perdeu a autoridade cultural e o monopólio na direção de condutas e consciências. Assim, Hannah Arendt se refere a uma liberdade semelhante, como derivada da capacidade de pensar e compreender o sentido da ação; Richard Rorty a denomina de capacidade de redescrever a subjetividade por meio de novas metáforas e Agnes Heller, mais próxima de Nietzsche, chama-a de ética da personalidade.

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SEM FRAUDE NEM FAVOR
JURANDIR FREIRE COSTA
1o. Capítulo: "utopia sexual, utopia amorosa"  



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