terça-feira, maio 05, 2009

2ª. Aula
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Texto para o Cartel de MG
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Falamos até aqui da importância dos três registros na teoria lacaniana: RSI.


Vimos que o Real é o impossível de simbolizar: “o que não cessa de não se escrever”. E que o objeto a, no Registro do Real é a coisa (das Ding), o vazio: causa de desejo. Dizer que o objeto a “é causa de desejo” não é o mesmo que dizer que “é a causa do desejo”. O objeto não é causa primeira, nem causa última. Afinal, a psicanálise não é uma teoria desenvolvimentista. Causa, neste sentido, pode ser compreendida como potência. É como dizer que a tela em branco é causa de imagens, na arte e no cinema. Quando entramos em um cinema e constatamos a presença da grande tela em branco, podemos ficar tranqüilos, pois sabemos que ao apagar das luzes a tela se iluminará permitindo o desenrolar da outra cena.
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Vimos que o registro do Simbólico é o campo da contingência: “do que cessa de não se escrever”. É, por isso mesmo, o campo do Outro (A). Lembremo-nos que a noção de Outro em Lacan desdobra-se em várias texturas. O Outro é o inconsciente, mas é, também, o campo da Cultura enquanto linguagem, ou rede significante; e, ainda, quando falamos no grande Outro podemos dizer que ele é encarnado por figuras reais da história subjetiva de um sujeito: mãe, pai, os grandes mestres e os grandes amores.
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Esse é o campo do Sujeito, do desejo, das demandas e dos significantes. Aqui, é preciso pontuar que a psicanálise não se interessa pelos signos – significante + significado . A psicanálise enfatiza a não relação entre o significante e o significado, inscrevendo-os em registros separados: no Simbólico os significantes; no Imaginário os significados.
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Já o objeto a, no Registro Simbólico, tem o valor de semblante. Ele é o que da pulsão se escreve e se inscreve no corpo. Nesse campo, podemos falar de Pulsão Oral – cujo objeto é o seio -, de Pulsão Anal – objeto fezes, excrementos -, Pulsão Escópica – objeto olhar -, e Pulsão Invocante – objeto voz.
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Para Lacan a Pulsão Oral e a Pulsão Anal estão intimamente relacionadas com as demandas. Já a Pulsão Escópica e a Invocante estão em relação com o desejo. Por isso, Lacan pode dizer que a voz e o olhar é algo do sujeito que está no campo do Outro, pois o desejo é desejo do Outro. Seja o Outro enquanto inconsciente, seja o Outro encarnado numa figura parental.
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Quanto ao Registro Imaginário, podemos dizer, em primeiro lugar, que ele é o campo da necessidade: do que não cessa de se escrever. Por isso, é o campo da imagem especular, do Estádio do Espelho, do Narcisismo, do Eu, do amor e dos significados enquanto produção de sentido.
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Embora o objeto a escape a especularização, ele é a condição da imagem narcisista: i(a). Ao mesmo tempo em que a imagem mascara o objeto, forma-se a partir dele.
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No texto de Machado de Assis, o espelho que nos interessa é primeiramente o olhar da mãe e, depois, o da tia. É sob esses olhares que o eu se identifica com a alma – o ideal – do alferes, e institui o poder alienante da especularidade narcísica.
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Até aos oito meses, a criança não tem uma imagem total de seu corpo. Por volta desse período acontece o que Lacan chamou de estádio do espelho: a criança experimenta seu corpo como uma unidade. Fundamental, nessa operação, é o olhar do Outro para confirmar esta unidade e dar consistência ao eu.
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Para a psicanálise, o corpo anatomofisiológico sustenta vários outros corpos. Existe uma similaridade e uma continuidade entre esses corpos, mas não uma homogeneidade.
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No Registro Imaginário, o corpo se faz representar pela “imagem do corpo”. Mas essa imagem não é, simplesmente, a imagem especular. A imagem do corpo é formada por uma bricolagem de fragmentos de percepções unificadas por um ideal. Quanto maior a aderência entre a imagem e o ideal, mais distante a imagem do corpo está da realidade.
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E, como dirá Lacan, o que sustenta essa imagem é algo que não se deixa representar na imagem especular. Podemos representar esse algo-a-mais - ou a menos, pois é um menos que se apresenta como mais -, pela idéia do agalma platônico. Lembremo-nos que no Banquete, quando Alcibíades faz seu elogio a Sócrates, ele diz que a imagem corporal de Sócrates não era das mais belas. Na verdade, dizem que Sócrates era muito feio. Mas esta imagem feia velava um objeto precioso, um objeto cintilante, ou seja, o agalma. Este brilho transformava a imagem de Sócrates, fazendo-o parecer belo ao olhar do outro.
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No amor, a algo no outro que o sujeito enamorado não captura, mais antes, é capturado por ele. Criam-se, então, várias historinhas para dar sentido a essa captura. No entanto, ela sempre nos escapa. O que, muitas vezes, causa angústia. Lacan descreve a estratégia do desejo na neurose obsessiva como aquela da destruição da imagem do Outro e, principalmente, do objeto de amor: destruir i (a) para visar a sem mediação.
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Até a década de 70 – Seminário XX - Lacan situa no Registro Simbólico, o corpo epistêmico – um corpo de saber - e o corpo erótico. No Registro do Real, o corpo de gozo. Depois desse período, Lacan faz algumas mudanças nessa articulação. Na aula de hoje, ficaremos com a leitura anterior ao Seminário XX.
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Assim, no Simbólico falamos de um corpo epistêmico, um corpo de saber. Cada um de nós conhece os avisos de seu corpo. Alguém pode dizer que não come melancia, porque lhe faz mal. Ou que não toma mais de cinco cervejas porque não vai agüentar a rebordosa do dia seguinte. Esses são alguns saberes que o corpo nos ensina.
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No Simbólico, também, se constitui o corpo erógeno: o gozo sexual fálico. Esse investimento sexual é a inscrição dos significantes no corpo. Essa inscrição da forma à cartografia erótica do sujeito. É dela que fala Francisco Bosco em seu texto. Cada relação, cada “contrato” com o outro, pode produzir uma mudança nessa cartografia.
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Já no Real, o que se apresenta é o corpo de gozo. Um gozo não sexuado, um gozo fora do significante. Podemos aproximar a noção lacaniana do corpo de gozo da noção de “corpo sem órgão”, de Deleuze.


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