segunda-feira, outubro 18, 2010

Ecos de Freud

Freud realizou uma longa viagem no tempo e no espaço para muito longe de sua amada casa em Viena.
Esteve em Paris, na juventude, onde acompanhou o trabalho de Charcot e o espetáculo do hipnotismo: aonde uma Augustine, espécie de celebridade da época, era exibida em palestras públicas e sessões de fotografia como uma perfeita ilustração da histeria. Freud também se tornaria um “ídolo pop”, cujas proporções atingiriam escala mundial, com seu rosto expressivamente reproduzido com e sem seu emblemático charuto, em capas de livros, camisetas, selos, cartazes de cinema, marcas de charuto, canecas, quadros realistas e surrealistas. E suas idéias discutidas numa infinidade de livros, artigos acadêmicos, jornalísticos, romances, contos, poemas, peças de teatro, documentários e novelas de televisão. Até quem nunca leu a obra do mestre já ouviu falar dele tornando-o um símbolo de nossa cultura.

Em 1896, Freud, em Viena, deve ter se sentido o homem mais solitário do mundo, apresentando-se à Associação Local de Psiquiatria e Neurologia com a conferência “A Etiologia da Histeria”. A idéia de procurar a origem da histeria no abuso sexual das crianças, foi acolhida com repúdio e agressividade, como se o próprio Freud, um investigador do abuso, fosse convertido em abusador. Presidindo o encontro Richard von krafft-Ebing, o famoso estudioso da psicopatologia sexual, descreveu os argumentos de Freud como “um conto de fadas científico”. Em que Freud, claro, era o lobo. sua pureza, transportando e implantando o freudismo nos países onde imperam os brancos, anglo-saxões e protestantes com enorme sucesso.

A publicação de A interpretação dos sonhos, em 1900, é o marco fundador da aventura psicanalítica. O livro que na época vendeu pouco, foi lido atentamente por algumas pessoas que se aproximaram de nosso herói, fazendo história com a formação da Sociedade Psicológica das Quartas Feiras. Um laboratório para as idéias freudianas. A primeira escala para a disseminação mundial.  
 
A partir de então, Freud atrairia discípulos como a agulha girando livremente na horizontal da bússola é atraída pelo norte magnético. Só que a relação de Freud com sua sociedade é de mestre e discípulos, é vertical, é o seu nome e o seu retrato nas capas dos livros.

Freud fará história, mas ela será fruto da violência transformadora. De Viena para Zurique foi um salto, sua fascinação pela inteligência de Jung o converteria em um primeiro aliado que depois se tornaria um dissidente, um dos primeiros a contestar o modelo doutrinário freudiano, passando a integrar a esquerda freudiana. Jung foi o primeiro herege. Lou Andreas-Salomé, aliada retumbante, seria fiel até a morte em seu casamento epistolar com Freud. Alfred Adler que frequentava a casa de Freud às quartas-feiras, também abandonou a sombra do mestre. O discípulo fidelíssimo Ernest Jones sempre defendeu com intransigência a doutrina preservando

O mestre enxergava na religião uma ilusão e a civilização lhe causava o mal-estar. Ele, entretanto, pouco se manifestou sobre a política cataclísmica de seu tempo. Porém, Reich radicalizou na política, ele estava convicto que a sexualidade e a política são intimamente correlacionadas. Assim a repressão sexual seria um dos maiores mecanismos de dominação política. Ele colocou-se a esquerda freudiana.

Com a ascensão do nazismo na Alemanha, o Freud de papel e tinta é queimado. Freud vê nisso uma evolução, pois em outros tempos o queimado seria ele de carne e osso. Ele fugiu para Inglaterra com a ajuda da aristocracia francesa.

Um câncer na mandíbula lhe rendeu 33 cirurgias, e acabou por matá-lo em circunstâncias eutanásicas em 1939. Preferiu morrer com dignidade. Sua filha Anna o sucedeu. Seus discípulos e ex-discípulos fragmentaram-se em mais discípulos e ex-discípulos. Lacan, que fumava charutos, soube de Freud pelos surrealistas, retorna ao Freud seminal, formando novas hordas para vigiar as fronteiras da psicanálise. Hoje esta fauna implantou a psicanálise com diferentes tendência e correntes teóricas em mais de 40 países.

Álvares de Azevedo (1832-1851), o poeta romântico brasileiro, morreu antes de Freud (1856-1939) nascer, escreveu um epitáfio para Freud. O “poema do frade” começa assim:


E do meio do mundo prostituto

Só amores guardei ao meu charuto!

E que viva o fumar que preludia

As visões da cabeça perfumada!

Rafael Rodrigues Schmitt
Estudante de Psicologia da UNIVESC

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