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O ensaio termina
com a evocação do fim do luto e de uma libertação da libido, pronta agora a
reinvestir na vida e no mundo. “Reconstruiremos tudo que a guerra destruiu,
talvez sobre uma base mais sólida e duradora do que antes.” A palavra alemã
traduzida por “base” é Grund, isto é, “fundo”, e também “solo”, última
referência à terra de Goethe. De maneira cativante e paradoxal, o movimento
interior que nos carrega no vento da transitoriedade, da Vergänglichkeit, deixa
transparecer o que dura no tempo. Por outro lado, o Grund, nesse diálogo
entre o pensador e o poeta, na presença de Goethe, remete ao fundo, ao
solo do pensamento e da poesia: a língua. A “transitoriedade” goethiana e o
pensamento freudiano perduram na língua. A escrita é a morada do efêmero.
Se o pensamento
freudiano subsiste como obra, é pela força de suas descobertas intelectuais e
por habitar poeticamente a língua. Habitar poeticamente uma língua significa
que o pensamento encontra a poiesis das palavras, num abandono mútuo,
numa fecundidade amorosa, de que um dos exemplos, trêmulo e belo e perene, são
essas páginas sobre “A transitoriedade”. Nada mais apropriado para caracterizar
o ensaio freudiano do que a expressão de Schlegel: um “poema intelectual”.
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J.B. Pontalis e
Edmundo Gómez Mango
Freud
com os Escritores
Editora Três Estrelas,
2013
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